Qual aparência devo ter

18.8.15


Quando criança, eu costumava ser muito mais inteligente. Todos os dias que passam sempre me dão uma confirmação disso. Sabe aquelas crianças gordinhas que não estão nem aí com a opinião que os outros tem a respeito da aparência alheia? Então, eu era essa mesma.

Lembro que uma vez, em meus oito ou nove anos, estava assistindo uma reportagem do Fantástico (o que era uma raridade, visto que oito da noite minha mãe já mandava eu ir dormir porque se não, eu não acordaria cedo no dia seguinte para ir à escola e dormir pouco atrapalharia meu desenvolvimento e aprendizagem, era o que ela dizia) e vi que era sobre distúrbios alimentares em adolescentes. Não esqueço até hoje o que pensava enquanto assistia aquilo, "Nossa, pra que essas meninas se importam? Eu não vou ser assim, quando eu for adolescente, vou estar nem aí para o que os outros pensam, to me sentindo normal agora e vou continuar me sentindo normal pra sempre", não preciso dizer que uns cinco anos mais tarde eu estava aflita fazendo de tudo para ficar magra igual minhas amigas, né?

Sempre fui tímida, mas nunca parei para pensar e me preocupar se eu era bonita ou feia, assistia aquelas reportagens sobre a polêmica de que adolescentes faziam intervenções cirúrgicas, novamente pensava "Pra que elas estão se preocupando com isso, ninguém deveria ligar para beleza, se elas são desse jeito, então é normal ser assim. Se isso for pra ficar com alguém algum dia, não precisa ficar mudando, eu não vou mudar, se um dia eu encontrar alguém, a pessoa vai gostar do jeito que eu sou", vou ter mesmo que repetir o lance de que cinco anos depois eu estava me imaginando com um nariz mais fino, olho mais aberto, rosto menos redondo e as tantas vezes que fiquei chorando no canto do meu quarto por não ser bonita igual as meninas que estavam ao meu lado, na internet, revista e televisão?

O fato é que raramente as crianças que eram "imunes" aos bombardeios do tipo, permanecem imunes quando chegam na transição de criança para adolescente, falo de mulheres por ser o que mais sei, apesar de que tenho consciência de que os garotos não escapam da preocupação de ter certo tipo de aparência.

Minha adolescência foi um pesadelo no quesito autoaceitação, eu não gostava do que via no espelho. Posso afirmar que não foi somente o estirão da puberdade que fez minhas gordurinhas de criança desaparecerem. Não imagino quantas vezes me recusei a olhar minha imagem no espelho e muito menos quantas vezes me olhava só para ficar apontando defeitos. Eu havia esquecido por completo as afirmações que havia feito quando criança. Passei quase dez anos lutando contra o que eu era e como eu aparentava. Nunca era bonita o suficiente e o corpo nunca era o mínimo socialmente aceitável. E, quando o problema está dentro de você, pode ter certeza que ele vai influenciar tudo o que te cerca, é como se não gostar de si mesmo te cegasse. Isso destrói todas as maneiras que você se vê e as que você enxerga o mundo. No final, você está sozinha, porque, se não gosta nem do que é, como que vai conseguir deixar que outros se aproximem? Não dá.

Tenho uma foto tirada acho que na época que citei no começo do texto, ela é o exemplo perfeito do que estou querendo dizer. Ela foi feita em um pesqueiro, eu ainda era a criança gordinha e estava de biquíni, tinha também feito uma amiga no dia, na foto nós estávamos nos abraçando de lado, eu estava com um sorriso enorme e não ligando nem um pouco que minha barriga estava ocupando uma parte da foto (hehe). Se eu fosse tirar um foto de biquíni, tanto na adolescência como hoje em dia, certamente faria os truques que toda mulher com essas paranoias fazem: colocam o braço, ficam de lado, vestem um short, ficam com metade do corpo escondido atrás de alguém, coisas assim.

É, não posso dizer que minhas crises já passaram, eu ainda não sou satisfeita com minha aparência nem com meu peso. Mas parece que aos poucos estou voltando a ser como eu era quando criança, já aceito coisas em mim que, na minha fase difícil, nunca pensava que conseguiria aceitar, prefiro minha cara sem muita coisa no dia a dia, apenas um rímel e eu já estou satisfeita - afinal, se eu, a pessoa mais importante sobre o assunto, consigo ficar ok com o que vejo, por qual motivo os alheios não conseguiriam? -. Já consigo entender que não devo me envergonhar de como me pareço, pois, cada coisa que é diferente em mim, é o que me marca, e quem é que não gosta de ter suas próprias características?

Ainda tenho muito caminho para andar, mas acho que o principal é isso, né? Perceber o quanto foi suscetível demais com relação ao mundo exterior e "em como você tem que se parecer", bom, a pior das pressões é a autopressão, ver como os da sua volta são na aparência e como isso ajuda, e muito, a levarem a vida de maneira feliz, faz com que aumentemos nosso grau de miserabilidade. Também é muito importante se reconectar com quem costumava ser, lembrar das opiniões que tinha quando nada disso era algo que afetava, tentar trazer para os dias atuais a essência do que pensava quando criança é uma das melhores coisas. Aquilo de que criança não tem malícia, de que vê o mundo de forma pura e direta é uma das maiores verdades. Criança, quando educada em um bom meio, não se importa com nada. Seria bom se, ao crescermos, continuássemos sem nos preocupar com essas coisas.

Você poderá GOSTAR TAMBÉM:

0 comentários

Subscribe